quinta-feira, fevereiro 16, 2012

Ilustrações para artigo científico sobre briologia


Dendroceros paivae sp. nov. 1. Thallus with two young capsules. 2. Spore. 3. Pseudoelater. 4. Transverse section of costa. 5. Epidermal cells of capsule. 6. Superficial view of wing cells. 7. Thallus with a long mature sporophyte (Scales: 1-100 μm; 2-10 μm; 3 and 6-25 μm; 4 and 5-50 μm; 7-0.25 cm).


Foi publicado há poucos dias um artigo científico que inclui quatro ilustrações minhas. É assinado pelo investigador César Garcia, que pertence à equipa do Centro de Biologia Ambiental do Jardim Botânico da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Neste laboratório são estudados briófitos, ou seja, musgos e plantas afins: hepáticas e antocerotas. Estas pequenas plantas representam um estádio primitivo da evolução dos organismos vegetais e, entre as utilidades práticas que lhes são reconhecidas, conta-se a de indicadores da qualidade do ar.

O artigo científico descreve quatro espécies de antocerotas, da família Dendrocerotaceae, presentes em São Tomé e Príncipe. Está disponível online no site Cryptogamie em acesso livre para utilizadores registados.

Uma das espécies descritas é nova para a ciência e foi baptizada com o nome paivae em homenagem ao professor Jorge Paiva, notável pela sua investigação em botânica e pelo seu esforço em promover a conservação da natureza. Para saber mais sobre o trabalho de César Garcia e sobre a homenagem a Jorge Paiva, recomendo a leitura do artigo no Ciência Hoje.




Dendroceros herasii Infante (LISU 237201). 14. Superficial view of wing cells. 15. Thallus with mature capsule. 16. Spore. 17. Epidermal cells of the capsule. 18. Pseudoelater. 19. Transverse section of costa. 20. Gemmae (Scales: 14 and 17-50 μm; 15-0.25 mm; 16-10 μm; 18-100 μm; 19-30 μm; 20-25 μm).



Dendroceros crispatus Nees (LISU 237209). 27. Thallus with capsule. 28. Spore. 29. Transverse section of costa. 30. Pseudoelater. 31. Superficial view of wing cells. 32. Epidermal cells of capsules (Scales: 27-0.25 mm; 28-10 μm; 29-100 μm; 30 and 32-50 μm; 31-33 μm).



Megaceros flagellaris (Mitt.) Steph. 37. Thallus with mature capsule. 38. Spore in proximal view. 39. Pseudoelater. 40. Epidermal cells of capsules. 41. Cells of thallus lamina including the margin. 42. Transverse section of capsule wall (Scales: 37-0.6 mm; 38-10 μm; 39, 40, 41 and 42-50 μm).






O meu trabalho de ilustração foi feito a partir da observação de plantas em lupas binoculares e microscópios. Translúcidas e rendilhadas, são pequenas e frágeis preciosidades, mais reluzentes ou mais rugosas, conforme o seu grau de hidratação. Apesar do valor estético da sua superfície - cor, transparência, brilho e textura - o que importa representar neste caso é a morfologia, de maneira a mostrar as características representativas de cada espécie.

O desenho tem aqui uma função descritiva e usa uma linguagem que procura ser tão clara e inequívoca quanto o método científico o exige. Esta linguagem tem como léxico a linha e o ponto.

A linha, além de estabelecer os limites de cada estrutura, também indicia a progressão das superfícies e as suas relações de sobreposição. Uma linha de contorno também pode ajudar a indicar a volumetria de cada massa sob a iluminação convencional, com origem acima e à esquerda do objecto: os contornos iluminados são então representados com linhas finas, claras; e os contornos em sombra são representados com linhas espessas, escuras.

O ponto é usado em diferentes concentrações para sugerir textura, espessura ou sombra.

Devo esclarecer que as imagens que obtive através das objectivas nem sempre se pareciam com o que vim a desenhar. Principalmente as células das cápsulas, vistas ao microscópio, estão longe de se parecerem com os meus desenhos finais. Para interpretar aquilo que eu estava a ver sob a lente foi necessário comparar os vários planos de focagem do microcópio e ter como referência as representações de células de cápsulas feitas por outros ilustradores.

Ao contrário do que pensam os leigos, a objectividade em ilustração científica raramente tem a ver com um realismo fotorrealista. Na verdade a objectividade tem mais a ver com o rigor na interpretação e formalização da realidade, ainda que essa realidade tenha que ser substituída por códigos que se afastam das aparências.

A objectividade aqui tem a ver com abstracção e com uma codificação que vai ao encontro da consistência da ilustração taxonómica como um todo. Idealmente, uma ilustração de uma espécie desenhada hoje deveria poder ser colocada lado a lado com uma ilustração de uma outra espécie semelhante desenhada no século XIX, para podermor comparar as caraterísticas de ambas sem qualquer interferência de técnicas ou estilos dos autores.

Penso que isto torna claro o porquê de a ilustração científica continuar a fazer sentido numa época em que temos a fotografia digital à nossa disposição. É que a fotografia não possiblilita o nível de selecção e interpretação que o desenho permite. Há que tirar partido daquilo que o desenho ou a fotografia nos dão e combiná-los da melhor forma para mostrar a riqueza do nosso objecto de estudo.

Agradeço ao Dr. César Garcia e à Drª Cecília Sérgio a oportunidade de voltar a colaborar na ilustração das publicações da equipa do laboratório do Jardim Botânico e pela generosidade de me apresentarem a esta dimensão ilimitada de coisas pequenas e verdinhas. :)

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